Dia 24 de Abril de 1974.
Éra Terça Feira, regressado de um dia em S. Salvador do Congo, onde nos deslocavamos todas as Terças Feiras.
Uns para tirar a barriga de misérias( a vida no mato éra dificil), outros para ir ao Médico ou fazer exames.
Chegamos, ainda tivemos tempo de fazer um joguinho de futebol, depois um banho e fomos jantar.
Alguma movimentação junto dos técnicos de transmissões passava despercebida á maioria da tropa, eu tinha algumas informações de que se estava a planear algo por isso andava sempre "á cuca" e aquele dia estava a ser diferente, com o Furriel de transmissões muito irrequieto.
Fui para a Enfermaria e pela frincha da porta entreaberta, confirmei que algo andava no ar...
Improvisei uma cama em cima de uma marquesa e com as luzes apagadas mantive-me alerta.
O movimento ia aumentando com o passar das horas, fiz algumas perguntas mas o silêncio éra insuportavél...
Acabei por adormecer, sentado na marquesa e encostado á parede...
Seriam 02.00 da madrugada quando as minhas dúvidas foram desfeitas...
Houve uma revolução em Lisboa, as coisas estavam a corres bem para os revoltosos mas o medo estava instalado porque se sabia quase nada e quem era quem.
A confirmação veio dois dias depois quando o então, Tenente Ramalho Eanes, passou pelo Quiende com destino a Lisboa onde viria a ser um dos Homens de Abril.
Muito está por dizer.
Mas com todos os inconvenientes da Revolução passamos a ser um povo diferente,
pena que a dascolonização não tivesse obedecido a outros principios, sempre se podia ter evitado a fuga de tantos Portugueses das Colonias, teria sido bom para todos e os Povos e África não estariam hoje a viver nas péssimas condições que todos conhecemos.
A ditadura de Salazar e Caetano acabou mas proliferaram outras ditaduras muito mais mortiferas para os povos de Angola, Guiné e Moçambique.
Ainda hoje se fala de injustiça para com os ex-Combatentes e eles sentem-na na pele todos os dias.
Até quando?
Hoje, Domingo, dia 20 de Abril, vale a pena ver a reportagem da SIC depois do Jornal da Noite.
Quem não puder ver, pode comprar a revista Visão deste fim de semana e ver a reportagem incrivél sobre o regresso do Ex-Combatentes, mortos em 1973 na Guiné e ali deixados em valas de terra num local a que chamaram cemitério.
Passados tantos anos estão de regresso, graças a boas vontades e muito voluntariado de quem um dia decidiu fazer justiça a 10 jovens que como muitos outros ficaram enterrados no "local do crime" e esquecidos por todos os Governos desde então até agora.
Como Ex- Combatente congratulo-me pelo exito da missão, lamentando que o mesmo não se possa fazer a tantos outros para sempre enterrados longe das suas familias.
Obrigado á SIC/VISÃO pelo empenho e pela divulgação de imagens e entrevistas recolhidas, logo á noite estarei sentado a ver as imagens e a chorar de raiva por tudo o que aconteceu numa Guerra desigual para onde fomos enviados como carne para canhão. Ainda hoje somos os mal amados de um regime que nunca nos reconheceu como mereciamos e nem os governos do pós - Revolução de Abril o fêz.
José Lessa